A criação do Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB), apelidado de “CPF dos imóveis”, deve ampliar a fiscalização e pode gerar aumento indireto da carga tributária sobre proprietários e investidores. A medida, regulamentada pela Receita Federal, centraliza os dados de imóveis urbanos e rurais no Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (Sinter), integrando informações hoje dispersas entre cartórios, prefeituras, estados e União.

O objetivo é padronizar registros de imóveis urbanos e rurais em todo o país, dando mais facilidade no compartilhamento de dados entre cartórios, prefeituras e órgãos de fiscalização. A medida, prevista na lei complementar da reforma tributária sancionada em janeiro, entra em vigor em etapas até o fim de 2025.

Em entrevista à AutImob, especialistas em direito tributário e imobiliário afirmaram que o CIB não cria novos impostos, mas pode corrigir distorções em valores venais utilizados como base de cálculo de tributos como IPTU, ITBI, ITR e ITCMD.

Transparência e unificação de dados

Para o advogado Winder Garcia, especialista em direito tributário pela Universidade Federal de Goiás (UFG), a medida representa um avanço no controle e na transparência do mercado imobiliário. “O CIB é um número único de identificação atribuído a cada imóvel urbano ou rural no Brasil. Ele integra o Sinter e serve como chave de integração, permitindo que a vida do imóvel seja acompanhada de forma transparente e unificada, sem substituir o registro imobiliário”, explica.

Winder Garcia, advogado tributarista, especialista em direito tributário pela UFG/Foto: arquivo pessoal 

Garcia destaca que a centralização de informações dará à Receita Federal e aos municípios maior poder de cruzamento de dados. “Isso possibilitará identificar subavaliações, inconsistências ou omissões em cadastros. Na prática, muitos imóveis que hoje estão com valores defasados para fins de IPTU, ITBI ou ITR poderão ser reavaliados com base em informações mais próximas do valor de mercado”, afirma. 

Impacto maior para pequenos locadores

Um dos pontos de alerta levantados pelo advogado é o efeito sobre pequenos proprietários.

“O impacto tende a ser maior para os pequenos locadores. Grandes administradoras e investidores conseguem diluir custos e manter estruturas de gestão profissional. Já o pequeno proprietário, que geralmente depende do aluguel como complemento de renda, poderá sentir de forma mais imediata a majoração de IPTU ou outras incidências que surjam da atualização cadastral”, ressalta Garcia. 

Correção de distorções

Na mesma linha, Marcus Felipe Macedo, advogado graduado pela UFG, com especialização em direito imobiliário e empresarial, reforça que o CIB não cria novos tributos, mas pode alterar a base de cálculo dos já existentes.

Marcus Felipe Macedo, bacharel em direito pela universidade federal de Goiás , advogado com atuação especializada em direito imobiliário e empresarial/Foto: arquivo pessoal

“Esse cadastro traz um sistema unificado que tende a aproximar o valor venal do imóvel da realidade. Em muitos municípios ainda há distorções, como imóveis de R$ 200 mil ou R$ 300 mil tributados como se valessem R$ 100 mil. O CIB pode corrigir isso. Em outros casos, pode até beneficiar o contribuinte, quando o valor venal está acima do valor real de mercado”, explica.

Fiscalização mais rigorosa

A unificação de dados também deve reduzir o espaço para negociações informais e contratos de gaveta, avalia Garcia. “Como cada imóvel terá um identificador nacional, operações informais perderão atratividade. A tendência é de estímulo à formalização, garantindo maior segurança jurídica”, aponta.

Macedo, porém, ressalta que ainda haverá quem opte por não registrar formalmente transações, mesmo com o risco envolvido. “A gente costuma dizer que é proprietário quem registra. O sistema trará mais informações, mas não elimina de vez o problema”, disse o advogado.

Reforma tributária e novos desafios

Embora o CIB não institua impostos, a sua aplicação se conecta ao contexto da reforma tributária, que prevê a incidência de novos tributos sobre consumo, como o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Para Macedo, a mudança gera apreensão no setor.

“Mesmo com o abatimento de 70% previsto para locações, existe uma expectativa de que a tributação para imobiliárias chegue até o dobro do que é hoje. O mercado ainda avalia os efeitos dessa transição”, afirma.

Benefícios superam riscos

Apesar dos desafios, ambos os especialistas veem avanços na medida. Para Garcia, “os benefícios superam os riscos, pois fortalecem a formalidade, a transparência e a segurança nas relações imobiliárias”. Macedo complementa: “O cadastro trará previsibilidade e maior segurança jurídica, mas também pode aumentar a arrecadação. É um equilíbrio entre transparência e impacto fiscal”.