Foto: Governo Federal/Ricardo Stuckert

O governo federal pretende reformular o modelo de financiamento imobiliário no Brasil e discute os detalhes da proposta com os principais bancos do país. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu com os presidentes da Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e de outras instituições financeiras públicas do país. A expectativa é que Lula se reúna ainda com os CEOs de grandes instituições privadas como Itaú Unibanco, Bradesco e Santander, para alinhar o novo marco regulatório do crédito habitacional. A medida é considerada estratégica para garantir o crescimento sustentável do setor, em um momento de esgotamento do atual modelo baseado na caderneta de poupança.

O novo modelo proposto pelo Banco Central prevê que 100% do funding dos financiamentos imobiliários passe a ser captado no mercado financeiro, eliminando gradualmente a dependência da poupança. A proposta inclui ainda mecanismos de flexibilização no uso de recursos e incentivos para financiamentos corrigidos pela inflação. A intenção é tornar o crédito mais dinâmico, ampliar a competitividade entre instituições e, ao mesmo tempo, garantir que os bancos mantenham o interesse e a rentabilidade na concessão dos empréstimos.

Antes do encontro com Lula, os presidentes dos quatro maiores bancos do país participaram de uma reunião, com o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, para conhecer os principais pontos da proposta. As discussões estão sendo lideradas pelo próprio Galípolo, que apresentou o plano ao presidente da República na semana retrasada. O governo vê a participação ativa dos bancos como fator decisivo para o sucesso da transição.

Hoje, os recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) são a principal base de financiamento habitacional no Brasil. Os bancos são obrigados a direcionar a maior parte dos depósitos da poupança para o crédito imobiliário e a manter 20% desses recursos recolhidos compulsoriamente no Banco Central. A proposta em análise altera essa lógica: permitiria aos bancos utilizar parte desses recursos do compulsório, até então imobilizados, como lastro para novos financiamentos, desde que vinculados ao prazo de vencimento das operações.

Na prática, a cada R$ 1 liberado para crédito imobiliário, R$ 1 do compulsório seria desbloqueado. No entanto, o dinheiro não estaria necessariamente carimbado para o crédito habitacional: o banco poderia aplicá-lo livremente, inclusive em títulos de longo prazo, desde que respeitada a equivalência de prazo. A proposta amplia a liberdade operacional das instituições, mas também exige uma reestruturação na forma como o crédito é ofertado no país.

Outro ponto em debate é a criação de incentivos para financiamentos atrelados à inflação. Esse tipo de crédito, embora represente risco maior ao consumidor em momentos de alta dos preços, tende a ter taxas de juros iniciais mais baixas, o que pode ajudar a estimular a contratação em um cenário de juros ainda elevados no Brasil.

A proposta está sendo discutida também com técnicos da área de crédito dos bancos e representantes da Febraban (Federação Brasileira de Bancos). A expectativa do governo é repetir o modelo de diálogo que resultou, no início do ano, na criação do novo consignado para trabalhadores da iniciativa privada, também desenvolvido com participação direta dos bancos e lançado oficialmente em março.

Para o setor imobiliário, a mudança pode representar uma guinada significativa. Incorporadoras, construtoras e investidores acompanham com atenção o avanço das discussões, já que o novo modelo pode interferir diretamente no volume de crédito disponível, nas taxas de juros praticadas e na dinâmica de lançamentos e vendas nos próximos anos.

Com a poupança cada vez mais pressionada e os limites de captação se aproximando do teto, a busca por uma nova base de funding é vista como inevitável. A transição, no entanto, precisa ser planejada com cautela para evitar retração do crédito ou aumento de custos para o tomador final. O governo aposta no diálogo com o setor bancário como caminho para alcançar equilíbrio entre segurança financeira, atratividade para os bancos e fomento ao mercado imobiliário.