Apesar do crescimento expressivo registrado em 2024, o setor imobiliário brasileiro enfrenta em 2025 um cenário de maior complexidade. Um estudo da Grant Thornton, uma das maiores empresas globais de auditoria e consultoria, aponta que as incorporadoras devem adotar uma postura mais cautelosa no segundo semestre do ano, diante de um ambiente econômico marcado por juros elevados e custos crescentes na construção civil.

O levantamento, chamado Incorporadoras Q4 2024, reforça dados já divulgados pela Brain em parceria com a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), que indicam um salto de 18,6% nos lançamentos e de 20,9% nas vendas entre 2023 e 2024. Ao todo, o setor acumulou um crescimento de 88% no volume geral de negócios desde o período pandêmico. A recuperação foi impulsionada, em grande parte, pela confiança das incorporadoras e pelo fortalecimento da demanda habitacional.

No entanto, os bons números de 2024 não se repetem automaticamente em 2025. Com a taxa básica de juros (Selic) ainda elevada, 14,75% ao ano em maio, o crédito imobiliário continua caro, impactando diretamente o poder de compra da população e dificultando o acesso à moradia, especialmente para as faixas intermediárias e de alto padrão.

Pressão nos custos e nas margens

Além dos juros altos, o Índice Nacional da Construção Civil (INCC-DI) segue pressionando os custos do setor. O indicador acumulou uma alta de 7,54% nos 12 meses encerrados em março de 2025. Esse cenário afeta especialmente os empreendimentos em que o financiamento é feito apenas após a entrega das chaves, prática comum no mercado de média e alta renda, o que aumenta a exposição das incorporadoras aos riscos financeiros durante o período de obras.

De acordo com Thiago Bragatto, sócio de Auditoria da Grant Thornton e coordenador do estudo, a principal preocupação no curto prazo é com a capacidade de crédito dos consumidores. “O programa Minha Casa, Minha Vida continua sendo essencial para a base do mercado, mas mesmo esse segmento sente os efeitos do crédito caro”, afirma.

Outro ponto de atenção é o aumento dos distratos, quando compradores desistem do imóvel antes da entrega, que pode gerar prejuízos com o pagamento de IPTU, condomínio e custos operacionais de revenda, afetando o fluxo de caixa das empresas.

Demanda segue forte nas faixas de menor renda

Mesmo com os entraves macroeconômicos, a procura por imóveis nas classes C e D segue aquecida, sustentada pelos subsídios e estímulos do governo federal. A avaliação é de Maria Regina Abdo, sócia de Auditoria e líder de Real Estate da Grant Thornton. Para ela, o mercado popular deve seguir ativo, ainda que enfrentando gargalos relacionados ao crédito e à inflação de insumos.

“Já o mercado de média e alta renda pode apresentar uma desaceleração no segundo semestre, com aumento dos estoques e pressão sobre os preços em algumas regiões”, destaca Maria Regina.

Luxo resiste, mas atenção aos distratos

Mesmo diante das adversidades, o segmento de imóveis de luxo e superluxo se mostra resiliente. A solidez desse nicho se deve ao perfil do comprador, geralmente menos dependente de crédito, e também ao maior grau de proteção jurídica proporcionado pela Lei do Distrato, que trouxe mais previsibilidade para as incorporadoras.

“O mercado de alto padrão continua sólido, especialmente em praças com forte valorização e escassez de terrenos. Mas os distratos ainda preocupam e exigem gestão estratégica por parte das empresas”, analisa Bragatto.

Inovação ainda é limitada

Outro desafio apontado no estudo é a baixa adoção de tecnologias no setor da construção civil. Apesar dos avanços recentes, a digitalização dos processos e a automação dos canteiros de obra ainda são incipientes. A falta de mão de obra especializada e a resistência a modelos construtivos mais eficientes também dificultam ganhos de produtividade.

Para os analistas, a inovação tecnológica será determinante para reduzir custos, melhorar prazos e manter a competitividade do setor, especialmente em um contexto de margens mais apertadas.

Perspectivas para o segundo semestre de 2025

Com um cenário macroeconômico desafiador e uma Selic que deve seguir alta ao longo do ano, as incorporadoras tendem a adotar uma postura mais seletiva nos novos lançamentos. A expectativa da Grant Thornton é de um crescimento mais gradual, com foco em projetos de maior liquidez, bom desempenho comercial e controle rigoroso de despesas.

O segundo semestre de 2025 será marcado por mais cautela, com o setor priorizando sustentabilidade financeira e segurança jurídica. O desafio será manter o equilíbrio entre oferta, demanda e rentabilidade, sem abrir mão da inovação e da qualidade que os consumidores cada vez mais exigem.