O número de imóveis usados financiados pelo programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV) disparou nos últimos anos e atingiu um novo recorde em 2024. De acordo com dados compilados pelo FGV Ibre, foram 155 mil unidades usadas financiadas no ano passado, quase quatro vezes mais do que em 2022, quando esse número era de 42 mil.

O movimento, que poderia ser interpretado como um risco para o setor de construção civil, não representa um sinal de alerta, segundo a coordenadora de Projetos de Construção do FGV Ibre, Ana Maria Castelo. Ela afirma que a alta nos financiamentos de usados é parte da própria engrenagem do mercado e não deve comprometer os lançamentos de imóveis novos.

“A tendência é que ocorra uma redução dos imóveis novos que compõem o total de unidades financiadas pelo Minha Casa, Minha Vida, mas não uma eliminação”, diz. “Muitas famílias que ascendem economicamente só vão conseguir comprar um imóvel da faixa seguinte se conseguirem vender o seu usado para alguém que esteja enquadrado nas exigências do programa.”

Desde fevereiro de 2023, todas as faixas de renda do programa passaram a aceitar imóveis usados. Até então, o foco do MCMV estava voltado principalmente para novas unidades. A ampliação foi decisiva para o crescimento dessa modalidade, que ganhou ainda mais tração em 2024.

Participação expressiva

Mesmo com o avanço da aquisição de usados, os imóveis novos seguem sendo protagonistas do programa. Dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) apontam que 47% de todas as vendas de imóveis novos em 2024 foram realizadas por meio do Minha Casa, Minha Vida.

Criado em 2009, o programa habitacional nasceu com o objetivo de atender à demanda da população de baixa renda e, ao mesmo tempo, impulsionar a economia num período de crise internacional. Ao longo dos anos, o MCMV se consolidou como pilar estratégico para o setor da construção civil e ampliou suas regras de acesso, adequando-se às necessidades do mercado.

“É preciso pensar geograficamente”, alerta Castelo. “Em algumas regiões, especialmente mais consolidadas, a oferta de imóveis novos com os padrões exigidos pelo programa é escassa. Nesses casos, o financiamento de usados cumpre um papel fundamental.”

Regras e limites para imóveis usados

Apesar de ser possível financiar imóveis usados pelo MCMV desde 2011 com recursos do FGTS, as regras foram atualizadas em 2024. Entre as mudanças, houve redução do valor máximo financiado de R$ 350 mil para R$ 270 mil, além do aumento da entrada mínima para famílias das regiões Sul e Sudeste.

Já em 2025, foi criada a faixa 4, voltada a famílias com renda de até R$ 12 mil. Essa nova categoria permite o financiamento de imóveis usados com valor de até R$ 500 mil. A entrada exigida é de 60% para os estados do Sul e Sudeste, e de 80% nas demais regiões.

Para que o imóvel seja considerado usado, é preciso que o “habite-se”, documento que comprova a conclusão da obra, tenha sido emitido há mais de 180 dias. As exigências para financiamento seguem as mesmas regras aplicadas a imóveis novos:

- O comprador não pode possuir outro imóvel no município;

- Não pode ter sido beneficiado anteriormente por programas habitacionais;

- Deve comprovar renda compatível com as faixas do programa;

- Precisa apresentar capacidade de pagamento.

A Caixa Econômica Federal realiza ainda uma vistoria técnica obrigatória no imóvel usado, com a presença de engenheiros credenciados. O objetivo é garantir a segurança, salubridade, conservação e o valor de mercado do bem, que será usado como garantia no contrato de financiamento.

O crescimento do financiamento de imóveis usados dentro do Minha Casa, Minha Vida está longe de representar um enfraquecimento do setor de construção civil. Pelo contrário, segundo especialistas, a medida amplia as possibilidades de acesso à moradia e ajuda a destravar o giro do mercado. Em vez de sinal de alerta, a tendência reforça a importância de políticas habitacionais flexíveis e adaptadas à realidade local.