Entre janeiro de 2026 e 2033 acontece a transição da Reforma Tributária do consumo, que substitui o modelo atual por um IVA “duplo”: CBS (federal) e IBS (estadual/municipal). As alíquotas finais ainda não estão definidas, e isso mexe com margem, preço de tabela e fluxo de caixa. Em Goiânia — onde o mercado está cada vez mais competitivo e profissional — contratos claros, patrimônio de afetação e governança do recebível viraram moeda de confiança para bancos, investidores e clientes. Este texto junta leitura de campo, materiais de aula e os pontos quentes de funding + tributos para explicar o que muda e como se preparar.

O que realmente muda com a Reforma — e como isso afeta lançamentos

O que muda (em linguagem simples)

  • Fim do “pacotão” do RET como regra geral: o regime de 4% por obra existe hoje, mas a Reforma migra gradualmente para CBS/IBS. Como a alíquota final do novo sistema ainda não é conhecida, há incerteza de margem e de formação de preço;
  • Split payment (pagamento “fatiado” na origem): quando o cliente paga, o sistema separa automaticamente a parte de imposto e envia ao governo. A empresa recebe já líquido, o que muda o perfil de caixa;
  • Redutor de ajuste: um abatimento na base de cálculo ligado ao imóvel, pensado para evitar dupla tributação sobre custos já incorporados. É importante, mas não resolve tudo — precisa de simulação caso a caso;
  • ITBI na promessa de compra e venda: há discussões locais sobre antecipar a cobrança para a promessa; a orientação consolidada segue sendo o registro da propriedade. Trate como risco regulatório e acompanhe a prática de cada município.

Como as incorporadoras estão se preparando (saídas concretas):

  • Viabilidade com cenários tributários: simular CBS/IBS em faixas, incluir timing do ITBI (se houver tentativa de antecipação) e medir impacto em preço/m², VSO e caixa;
  • Precificação por praça/tipologia: tabelas com faixas de variação para absorver ajustes sem “quebrar” a narrativa comercial. Contratos e Quadro-Resumo atualizados: cláusulas de equilíbrio econômico-financeiro na transição e comunicação clara ao cliente sobre o que muda;
  • Calendário de lançamentos inteligentes: ordenar o pipeline por margem/risco e maturidade do novo sistema — não é acelerar “a qualquer custo”;
  • Treinamento de vendas: explicar sem juridiquês como tributo impacta preço e prazo, evitando promessas que a operação não sustenta;
  • Governança de caixa reforçada: preparar-se para split payment e comprovação de créditos/custos;
  • Visão de conjunto: Reforma não é “vilã” nem “salvação”. É variável-chave que entra desde a viabilidade— no contrato, no calendário e na conversa com o cliente.

Jurídico que vira confiança — e confiança que vira margem

Por que o jurídico saiu do bastidor? Porque reduz atrito e barateia o risco percebido por bancos, investidores e compradores.

Três pilares práticos (sem juridiquês):

Contrato com Quadro-Resumo “de verdade”  - Preço total e condições; prazos e tolerância de 180 dias; índices e multas claros; regras de devolução transparentes; obrigações recíprocas; foro e comunicações padronizados.

Efeito: menos litígio e distrato, ciclo de recebimento mais curto, “preço do risco” menor.

Patrimônio de Afetação + governança do recebível: caixa da obra segregado, auditorias, medições e liberações bem documentadas, aderência a banco/CRI/SCP;

Efeito: conversa melhor com financiadores, spread menor e mais segurança ao comprador.

Pós-venda como parte do contrato psicológico: onboarding do cliente, cronograma transparente, SLA de chamados, métricas de NPS/CSAT e plano de ação.

Efeito: reputação que aumenta conversão e barateia o funding no próximo ciclo.

Tradução financeira: confiança aparece na taxa do funding, no índice de distratos e no giro de recebíveis. Contrato bom não é “duro” — é claro e executável.

Funding e viabilidade: disciplina antes de velocidade (e por que dizemos “VAMOS”)

A viabilidade estática filtra o terreno; a viabilidade dinâmica decide o VAMOS. Nela entram:

  • Curva de obra e curva de vendas (VSO realista);
  • Exposição máxima de caixa (com colchões de INCC);
  • TIR/VPL com custo de capital atualizado;
  • Cenários tributários (CBS/IBS, eventual ITBI na promessa, redutor de ajuste).

Estrutura de funding (sempre duas rotas):

  • Banco (plano empresário) com gatilhos por avanço físico e comercial;
  • Mercado de capitais (CRI/CRA/debêntures) e/ou SCP com investidor regional;
  • Governança: medições, liberações, covenants e contas vinculadas bem desenhadas.

Regra prática: não começamos sem duas rotas mapeadas, gatilhos claros e plano B se VSO/custos saírem da banda.

Passo a passo — da decisão ao pós-obra

1) Antes do VAMOS (terreno e tese)

  • Viabilidade dinâmica com 3 cenários (otimista, base, conservador) + sensibilidades tributárias.
  • Termo de aquisição/permuta com condições suspensivas (licenças, finanças);
  • Rascunho do calendário de lançamento vs. janela tributária.

2) Estruturar jurídico e financeiro

  • Contrato + Quadro-Resumo prontos para a transição;
  • Afetação e governança do recebível (contas vinculadas, auditoria, ritos);
  • Duas rotas de funding e package de banco/CRI/SCP preparado

3) Preparar o lançamento (marketing e vendas)

  • Quatro fases: pré-lançamento → lançamento → 90 dias críticos → sustentação;
  • Metas diárias de visita e fechamento;
  • Treinamento de imobiliárias e time;
  • Gestão ativa de tabela/espelho.

4) Obra com previsibilidade

  • Replanejamento mensal (erro ≤ 5%);
  • Painéis simples de Vendas, Caixa e Obra;
  • Comunicação proativa de cronograma ao cliente.

5) Entrega e pós-obra que protegem margem

  • SLA de assistência técnica e NPS/CSAT;
  • Encerramento jurídico/tributário organizado (memórias de cálculo, créditos).

Linha do tempo da transição (4 linhas, para não esquecer)

2026 — Ano-teste: destaque simbólico de CBS 0,9% e IBS 0,1% na nota; ajuste de sistemas e rotinas;

2027 — Início da entrada efetiva, convivendo com o sistema antigo;

2027–2032 — Transição escalonada;

2033 — Novo modelo pleno.

Afetação em destaque

Venda na planta é confiança. O patrimônio de afetação separa o caixa da obra, dá transparência para o banco/investidor e protege o comprador. Com a Reforma, continua indispensável: organizar o recebível, facilita auditorias e ajuda a baixar o “preço do risco” — o que preserva margem.

Conclusão: clareza, calendário e contrato

Em Goiânia não faltam bons produtos. O diferencial na transição 2026–2033 será planejar com tributos no centro da conta e contratos que gerem confiança. Menos “feeling”, mais calendário + contrato + caixa — e explicar isso ao cliente. Quem organiza o que promete e promete o que consegue executar atravessa o ciclo com margem estável e entrega um mercado melhor para compradores e investidores.







 Lucca Alves de Sá Peixoto é bacharel em Direito pelo IDP (Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa) e corretor de imóveis.